Brasil pode liderar o mercado mundial de crédito de carbono

Parece longínquo, mas 2050 está logo ali, a considerar a distância que separa 2021 da ECO92, um importante marco para a pauta climática. O acordo estabelecido na ocasião, a chamada Agenda 21, resultou na elaboração do Protocolo de Quioto, em 1997, para a redução da emissão de gases que produzem o efeito estufa. Em 2015, o Acordo de Paris firmado entre 195 países estabeleceu uma meta ambiciosa: zerar a emissão de gás carbônico até 2050. Neste contexto está incluído o Brasil.

Mas como podemos garantir o compromisso assumido? Neste sentido, o Projeto de Lei 528/2021, do deputado federal Marcelo Ramos (PL/AM), tem o objetivo de regular o mercado interno de crédito de carbono por meio de mecanismos de precificação. A iniciativa, além de apresentar a maneira mais efetiva de cumprimento do acordo, deverá trazer benefícios econômicos para o país por aumentar a competitividade brasileira no mercado internacional.

Para a Associação Brasileira de Bioinovação (ABBI), o mercado regulado estimulará a movimentação de recursos para o desenvolvimento de tecnologias e inovação. “O Brasil poderá liderar o mercado de descarbonização se investir em tecnologias descarbonizantes, e para auxiliar neste processo a bioinovação se apresenta como uma poderosa ferramenta”, avalia Thiago Falda, presidente executivo da ABBI. Outro ponto significativo, segundo ele, é o crescimento industrial e o fortalecimento das empresas nacionais que a regulação possibilitará, contribuindo para a recuperação econômica do Brasil.

Cíntia Urbano Neves, Gerente de Desenvolvimento de Negócios & Sustentabilidade da Yara Fertilizantes, ressalta a importância de um marco regulatório claro, moderno e alinhado às melhores práticas observadas mundo afora. Sobre o impacto do Projeto de Lei para a empresa, ela diz: “É essencial a adoção de instrumentos de governança climática que ampliem as vantagens competitivas do país na economia de baixo carbono e não criem um organismo antagônico ao que se entende como padrão global – por exemplo, nos ajustes contábeis das reduções de emissões correspondentes”.

O primeiro mercado regulado de carbono no Brasil foi criado em 2017, para o setor de combustíveis, com a aprovação da Política Nacional de Biocombustíveis (RenovaBio). De acordo com o presidente executivo da ABBI, a experiência bem-sucedida deveria ser expandida para os demais setores. “Mas sem sobreposição de regras ou taxação de carbono, que acabariam por onerar ainda mais os processos produtivos no país”, sublinha Thiago Falda.

Desde 2016, a petroquímica Braskem implementou a metodologia de Precificação Interna de Carbono, “Preço Sombra”, nas operações no Brasil. Com abordagem direcionada para gerir riscos e potencializar oportunidades no processo decisório de investimentos, o aprendizado da aplicação em território nacional, após quatro anos, direcionou a construção de uma curva de custos marginais de abatimento (MACC) com todas as iniciativas de mitigação potenciais ou em implementação.

Em relação ao impacto do PL 528/21 para a Braskem, Marina Rossi, Gerente Corporativa de Desenvolvimento Sustentável da empresa, explica: “Com base nessa análise de “Preço Sombra”, foi feita uma atualização do preço de carbono e definida uma estratégia global de precificação baseada em “Preço Implícito”, com abrangência em 100% das operações em todos os países. A estratégia conta com um plano para implementação, contemplando a adequação das ferramentas existentes, atualização de todos os documentos norteadores do processo, capacitação dos envolvidos e definição de KPIs para monitoramento”.

É possível aliar metas sustentáveis com lucratividade

Enquanto modelos de descarbonização são implantados ao redor do mundo, a natureza vem apresentando a conta – secas severas, incêndios florestais, eventos climáticos extremos frequentes. Empresas como a Yara Fertilizantes e a Braskem, no entanto, já colocaram em prática algumas políticas ambientais internas para mitigar o impacto ambiental dos seus negócios e atender a demanda da sociedade por produtos sustentáveis.

Para Cíntia Urbano Neves, da Yara, a sustentabilidade precisa ser vista nos seus aspectos social, econômico e ambiental, pois é impossível ser sustentável negligenciando o pilar econômico. “Estamos concentrando nossos esforços na descarbonização de alimentos e na construção de sistemas alimentares justos e resilientes, ao mesmo tempo em que usamos nosso conhecimento para descarbonizar outras indústrias e apoiar uma economia de hidrogênio limpo”, informa.

A Yara Fertilizantes utiliza ferramentas digitais inovadoras e eficientes adequadas às necessidades de cada agricultor, e possui fertilizantes com menor pegada de carbono. A empresa ainda prevê, em breve, o lançamento dos fertilizantes verdes, no Brasil, oriundos de processos produtivos mais sustentáveis, como hidrolise ou biometano. Além disso, a empresa criou a Receita Verde, que consiste na elaboração de um mercado de carbono, em que os agricultores são pagos pela captura e armazenamento do carbono.

Já a Braskem, assumiu um compromisso público de reduzir em 15% as emissões diretas de gases de efeito estufa até 2030 e alcançar a neutralidade de carbono até 2050. Atualmente, pelo menos 74% de toda energia elétrica comprada globalmente provém de fontes renováveis, de acordo com Marina Rossi.

Líder global na produção de biopolímeros, a empresa vem aliando sustentabilidade e lucratividade no desenvolvimento de novos produtos, a exemplo do polietileno verde I’m green, um plástico produzido a partir de matéria-prima renovável, a cana-de-açúcar. “Os polietilenos tradicionais utilizam matérias-primas de fonte fóssil, como petróleo ou gás natural. O I’m green captura até 3,09 toneladas de gás carbônico para cada tonelada produzida”, relata Rossi.

Evidentemente, no percurso do Brasil para 2050 está incluída a aprovação do PL 528/2021 e uma série de iniciativas públicas e privadas que garantam a implementação de novos modelos de negócio para uma economia de baixo carbono. Traçando o melhor caminho, o país poderá alcançar a liderança no mercado de crédito de carbono, o que resultará em ganhos econômicos, sociais e ambientais. Alguém tem dúvida?