Bioinovação e ESG: o papel da governança ambiental no alinhamento das cadeias produtivas

Em um mercado global aquecido, o consumo energético é exponencial. Entretanto, estima-se que 80% do gasto mundial de energia é proveniente de combustíveis fósseis, uma fonte escassa que pode causar danos ao meio ambiente. Ao mesmo tempo, a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura calcula que cerca de 30% dos alimentos produzidos no mundo são desperdiçados, contribuindo para 8% das emissões globais de gases de efeito estufa.

Tendo em vista os desafios globais — como mudanças climáticas e crises ambientais —, de que modo podemos rastrear os impactos de nossas ações e agir por soluções sustentáveis que reestruturem as cadeias de produção?

Um dos caminhos é a Bioinovação e as práticas de ESG (governança ambiental, social e corporativa, em livre tradução do inglês). Baseadas em recursos renováveis, trata-se de contribuições tecnológicas que resultam no desenvolvimento social e no crescimento econômico sustentável. Por sua vez, elas podem ser viabilizadas por práticas empresariais que incorporem critérios ambientais em suas estratégias.

Significa dizer que há maior competitividade e longevidade das empresas que apoiam seus modelos de negócios na tríade ambiental, social e de governança. Segundo pesquisa recente da Bloomberg, as práticas de ESG devem atrair, em 2025, o montante de US$ 53 trilhões em investimentos.

Contudo, quando o assunto é a letra E da sigla — o meio ambiente —, as companhias precisam trilhar um longo caminho para que se atinja o grau de maturidade necessário à gestão das crises ambientais e climáticas já estabelecidas. Para concretizar esse objetivo, é preciso compreender quais são os principais desafios enfrentados pelos setores de produção recentemente.

Assunto está no radar das diferentes empresas

O foco em Bioinovação e ESG faz parte da estratégia de negócios de organizações como a Braskem, Raízen e IFF. De acordo com o especialista em Avaliação de Ciclo de Vida da Braskem, Yuki Hamilton Onda Kabe, a empresa se preocupa com o desenvolvimento sustentável desde sua fundação. “A política de sustentabilidade se fortalece por meio de macro objetivos, como gestão dos riscos climáticos e economia circular de carbono neutro”, explica.

Entretanto, na indústria de plástico, todo processo circular apresenta perdas. “Não é possível circularizar 100% dos materiais produzidos. A eficiência máxima que obtemos dos processos de reciclagem hoje giram em torno de 70% a 80%, um avanço que é muito positivo para o nosso setor”, pontua Yuki.

Por outro lado, a demanda por materiais plásticos crescerá na próxima década, continua o porta-voz: “Projeta-se que o consumo saltará dos 330 milhões de toneladas para de 1,2 bilhão de toneladas até 2050. Assim, é fundamental desenvolver novos materiais que venham de outras fontes de carbono, como a biomassa”.

Nesse sentido, a bios — tudo o que se relaciona à vida — torna-se uma fonte alternativa como matriz geradora de átomos de carbono, uma vez que esse elemento químico faz parte das moléculas orgânicas presentes na atmosfera, nos ambientes aquáticos, na terra e nos seres vivos.

A biomassa, composta por resíduos de origens vegetais ou animais, passa a ser empregada na produção de energia e de matérias-primas e resinas para as diferentes indústrias, como a automobilística e calçadista.

De acordo com o coordenador de Sustentabilidade da Raízen, Bruno Henrique Maier, a transformação energética também é um pilar importante para o fomento à Bioinovação. Nesse modelo, a Raízen tem como meta aumentar substantivamente seu portfólio de fontes renováveis até 2030.

“Buscamos uma utilização e reaproveitamento completo dos produtos e subprodutos. Para atingirmos tais metas, o investimento maciço em Bioinovação é fundamental, como as práticas de melhorias do uso do solo e a reutilização dos resíduos orgânicos como fonte de nitrogênio”, explica.

A transição energética diz respeito também à mudança sistêmica das indústrias, na qual se leva em conta os diferentes stakeholders. “O ESG compreende todo o nosso ecossistema. Para isso acontecer, estabelecemos um plano estratégico de sustentabilidade e definimos compromissos de governança intrínsecos à Bioinovação”, acrescenta o coordenador da Raízen.

Essa também é uma missão da IFF. Segundo a diretora de divisão de Health & Biosciences da organização, Deia Vilela, trata-se de um compromisso com o estreito alinhamento entre seus clientes para o desenvolvimento de soluções enzimáticas seguras, saudáveis sustentáveis.

“A tecnologia enzimática está desempenhando um papel fundamental para ajudar as empresas a reduzir o consumo de energia e água. No ramo da cervejaria, por exemplo, podemos fornecer reduções de até 47% no consumo de energia renovável e 41% no consumo de água, resultando também na redução de 36% das emissões de CO2”, explica.

Por meio do equilíbrio entre a quantidade de emissões de gases de efeito estufa e a quantidade que está sendo removida da atmosfera, a biotecnologia é de grande importância no reaproveitamento de matéria. “As enzimas, através da reutilização de subprodutos da indústria de proteína animal (como vísceras, penas e resto de couros), também permitem que resíduos se tornem um recurso”, complementa Deia.

ESG é tema de interesse público

A partir da experiência, os executivos concordam que as práticas de governança ambiental, social e corporativa são o Norte para a Bioinovação, tanto nos processos e nos modelos de negócio, quanto na estruturação das cadeias de valor.

Considerando o amplo desperdício de insumos e, consequentemente, o aumento de emissão de gases de efeito estufa, é fundamental que as empresas desenvolvam estruturas baseadas no uso criativo de subprodutos, ampliando as práticas ESG.

Nesse sentido, Deia explica: “Estamos reavaliando aplicações para subprodutos de processos de fabricação, conduzindo projetos piloto de redução de desperdício de alimentos, comercializando novos ingredientes reciclados e desenvolvendo ainda mais nosso pipeline de novas oportunidades em potencial”.

Além disso, o ESG é uma agenda de interesse público que traz benefícios gerais: “Por ser uma pauta de todos, ela deve evoluir junto a políticas públicas que tenham uma visão holística na esperança de abranger os diferentes setores”, pontua Bruno.

Partindo desse pressuposto, as decisões pela redefinição energética devem trazer ampla eficiência e competitividade: “Precisamos de uma política a nível global e nacional de incentivo à Bioeconomia, indo além da bioenergia e biomateriais”, complementa Yuki.

Se implementadas, tais ações consolidarão a Bioeconomia avançada no Brasil, agregando valor às cadeias de produção ao mesmo tempo em que potencializam os seus resultados com responsabilidade social e ambiental.