Entrevista com Paulo Ganime (NOVO/RJ), Deputado Federal e 1º Vice-Presidente da Câmara da Frente Parlamentar da Bioeconomia




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ABBI: O alto impacto socioeconômico causado pelo novo coronavírus preocupa a governança pública, a privada e, principalmente, a sociedade. Diversos países vêm anunciando que a bioeconomia será a chave para a retomada do desenvolvimento econômico pós-pandemia e que o estímulo econômico deve estar associado à proteção do clima e a medidas de apoio às tecnologias modernas e às energias renováveis. Como o senhor vê a importância da bioeconomia brasileira como parte de ajuda na reestruturação econômica do país? E o que poderia ser feito de imediato para desenvolver esse setor como ponto auxiliar nessa recuperação imediata?    

Paulo Ganime: É importante sim que a indústria brasileira se desenvolva para que a nossa economia se recupere com base nos nossos maiores potenciais. A biodiversidade brasileira já estava em voga para se tornar um dos motores do crescimento econômico desde antes da chegada do Coronavírus, uma vez que mais de 20% de toda a biodiversidade do planeta está no Brasil.

As perspectivas para o setor até então eram de poder estimular, num horizonte de 20 anos, o potencial de instalação de 120 biorrefinarias e a geração de 217 mil postos de trabalho qualificados. Só isso, já atrairia, nesse mesmo período, um volume de investimento na ordem de 400 bilhões de dólares e geraria um aumento real no PIB de 160 bilhões de dólares, segundo estudo da ABBI baseado em dados do IBGE. Além disso, há toda uma indústria de biotecnologia que já desponta no Brasil e necessita de ajuda para remover os entraves que ainda a impedem de decolar. Se considerarmos também a Bioeconomia como forma de preservação da Amazônia, a exemplo do que é feito na Alemanha, o potencial econômico da floresta em pé será capaz de superar as dificuldades que levaram à criação da Zona Franca de Manaus, porém alavancará a economia da região Norte do país sem a necessidade de subsídios do Estado.

Passada a pandemia, é importante que o potencial do setor seja trabalhado de forma pujante para colhermos os frutos o mais breve possível, mas, para que isso aconteça, precisamos tirar os entraves para o desenvolvimento das indústrias, trabalharmos na infraestrutura do país para que o funcionamento dessas indústrias se torne viável e garantir que a população no entorno dessas localidades tenha educação de qualidade alinhada aos potenciais regionais. A biodiversidade propícia, nós já temos, agora é preciso darmos instrumentos para que ela seja aproveitada de forma responsável.

ABBI: Em junho de 2019, foi lançada a Frente Parlamentar Mista pela Inovação na Bioeconomia, atualmente com 234 parlamentares signatários e contou com a sua liderança na presidência. Como o senhor avalia o primeiro ano de atuação da Frente e quais os principais desafios de conduzir uma agenda de inovação e desenvolvimento tecnológico no Congresso Nacional?

Paulo Ganime: O primeiro ano foi de muito trabalho e o principal resultado foi, justamente, trazer à tona os debates acerca do assunto, além de conseguirmos reunir representantes do legislativo, do executivo, do setor acadêmico e do setor produtivo para trabalharem a estratégia da Bioeconomia avançada de forma coletiva. Muitos ministérios já dispunham de secretarias atuando nessa temática, mas a existência de uma Frente Parlamentar para estimular a comunicação com os parlamentares certamente contribuiu para o desenvolvimento do tema de forma mais fluida entre todos.

A ideia de servir como engrenagem entre as partes interessadas e de construir uma legislação capaz de dar segurança jurídica ao setor sem engessá-lo tem sido bem sucedida até o momento. Mesmo com o pouco tempo de atuação, temos conquistado relevância no Congresso. Na prática, tivemos cerca de seis meses de atuação seguidos de recesso e pandemia. Ainda assim, já vemos maior integração em prol de uma estratégia de desenvolvimento, a ponto de que o Protocolo de Nagoia, fruto de embates ao longo dos últimos 8 anos conseguiu alcançar um consenso e tem grande chance de ser ratificado em breve. Claro que isso não acontece exclusivamente pela existência da FPBioeconomia. No entanto, tenho certeza de que contribuímos tanto com as discussões quanto com a melhora do relacionamento entre todos os envolvidos.

Em virtude da pandemia, tivemos apenas agora em junho o primeiro evento da Frente de 2020 e passei a presidência ao meu colega de bancada Alexis Fonteyne (NOVO/SP), conforme havíamos combinado desde a fundação da Frente e que foi acelerado quando assumi a liderança do partido na Câmara dos Deputados. Sigo na vice-presidência, participando desta pauta de tão grande potencial para o país e tenho certeza de que, com a liderança do Alexis, seguiremos avançando na construção de um ecossistema mais acolhedor à pesquisa.

ABBI: Quais são as principais barreiras e oportunidades para a consolidação do Brasil como líder da Bioeconomia Avançada?

Paulo Ganime: As principais barreiras estão relacionadas à falta de liberdade para o empreendedor empreender no Brasil. É preciso construirmos um ambiente de inovação que traga menos burocracia às atividades já comprovadamente de baixo risco implementadas mundo afora, reduzindo o tempo e o custo necessário para que um produto vá da pesquisa às prateleiras. Com a promulgação da Lei da Liberdade Econômica, as agências reguladoras devem identificar o nível de risco das atividades e isso inclui as agências e institutos como a Anvisa, a CTNBio (Comissão Nacional de Biossegurança) e outros. Isso é uma oportunidade para usarmos a experiência de outros países em licenciamento para mostrar que diversas atividades poderiam seguir, aqui no Brasil, o mesmo padrão  desses lugares. E, se há algo que a pandemia tem nos mostrado, é que essa desburocratização é extremamente necessária, principalmente quando precisamos de velocidade para enfrentar a crise e conseguirmos nos reerguer ao final dela. Nas conversas com o setor produtivo, vimos o quanto o excesso de burocracia atrapalha a inovação e esse é um grande desafio: tornar o ambiente de inovação brasileiro mais atrativo, seja conversando com as agências reguladoras, seja construindo um arcabouço legislativo não impeditivo a quem quer empreender.

Um entrave igualmente importante é a falta de infraestrutura e de mão de obra especializada nas localidades de maior potencial. A ausência de infraestrutura, além de aumentar o custo logístico, pode inviabilizar completamente uma operação. É necessário também, conforme já comentei, que haja formação de boa qualidade e alinhada aos potenciais regionais para que todas as regiões do país possam se desenvolver a partir de atividades relacionadas a esse setor extremamente inovador.

Outra oportunidade já abordada anteriormente é a proximidade da ratificação do Protocolo de Nagoia. A ratificação é apenas o primeiro passo para que possamos participar dos debates acerca de como ele será implementado por cada país e de como ocorrerá a sua internacionalização, sem deixar que as peculiaridades do nosso país sejam ignoradas nessas negociações.

Além disso, temos um país extremamente biodiverso, grandes centros de pesquisa, um dos sistemas de catálogo genético mais avançados do mundo e empresas que, apesar de todos os entraves, insistem em investir no potencial brasileiro. Pela primeira vez, demos partida no desenvolvimento de um setor em sincronia com o restante do mundo e não precisamos copiar o que está sendo feito. Temos a chance real de participar dos debates iniciais, de construir junto e de assumirmos um papel de liderança no desenvolvimento tecnológico a partir da nossa biodiversidade. É importante trabalharmos para que essa chance não se perca e o Brasil consiga aproveitar ao máximo o potencial de que dispõe.